Tu não escreve porra nenhuma

Retrato de Amis quando angry young man
Retrato de Amis quando angry young man

Fico pensando quando fariam um desses no Brasil… Se você espremer o volume Escritor contra escritor, organizado por Albert Angelo, vai colher uns bons litros de bílis. O excêntrico catalão compilou nesta edição da El Aleph algumas das pérolas negras da literatura. Coisas como…

Kurt Vonnegut é o pior escritor dos EUA” [Gore Vidal]

ou

Vidal sofre do medo de ser tomado como chato, estúpido, antiquado, uma péssima atitude para um novelista” [Kingsley Amis]

ou

“Escrevia sobre beber para aproveitar alguma das horas que dedicava a isso” [Martin Amis sobre o pai, Kingsley]

No Brasil não temos essa tradição de falar na cara o que se pensa. Ou melhor, existe, mas a coisa não vira literatura; fica no xingamento de bar, logo esquecido pela falta de classe do tapa, em geral desferido à socapa. E, descontados os anônimos que abundam nas caixas de comentários, a conversa desfia-se junto da carne seca da feijoada, nunca em porrada lida em Times New Roman. Será nosso exaltado cordialismo?

“Toda a sua obra se centra em ser patético” [Frédéric Beigbeder sobre Michel Houellebecq]

Bellow é uma mediocridade miserável” [Vladimir Nabokov]

“Dei uma olhada nos livros de Bolaño e me aborreci espantosamente” [Isabel Allende] “Ele falava mal de todo mundo. Era uma pessoa extraordinariamente conflituosa que nunca disse nada de bom de ninguém. É um bom escritor que desgraçadamente morreu, mas isso não faz dele uma pessoa melhor”

Pero antes que Bolaño morresse, él dicho:

“Nem sequer acho que Isabel Allende seja uma escritora, é uma escrevinhadora”

“Não mudaria de idéia se tivesse bebido com ela. Primeiro, porque essas senhoras evitam beber com alguém como eu. Segundo, porque já não bebo. Terceiro, porque nem nos meus piores porres perdi uma lucidez mínima, um sentido da prosódia e do ritmo, um certo pudor ao plágio, à mediocridade ou ao silêncio”

“Se tivesse que escolher entre ela e António Skármeta, ficaria com Allende, mas escolhendo entre a espada e a parede”

Mais do genial chileno, que sofria… do fígado:

“Os méritos de Paulo Coelho? Os mesmos de Isabel Allende: vende livros”

“A literatura chilena gira em torno de um sol morto que se chama Pablo Neruda

“Como poeta, seriam umas bichas loucas, como Whitman e Blake. Neruda e Paz, no entanto, são só umas bichas”

“A melhor lição de literatura que deu Vargas Llosa foi fazer jogging nas primeiras luzes da alvorada”

Algumas das melhores são mesmo do pai de Martin Amis – que, a se crer nas capitulares das epígrafes colhidas por Angel, é um CARDOSO avant la LETTRE:

“QUE FILHO DA PUTA! Nabokov é um perfeito bobalhão, não acha? Representa tudo o que está errado na metade dos novelistas norte-americanos – há outras coisas piores na metade restante – e fodeu com muitos bobos daqui, inclusive meu pequeno Martin” [Kingsley, em carta a Philip Larkin]

“Com o senhor Dylan Thomas cheguei a um ponto em que só havia alcançado antes com Chaucer e Dryden, nem mesmo com Milton, que é DESEJAR VIOLENTAMENTE que esse tipo ESTEJA NA MINHA FRENTE para ser DEMONIACAMENTE MAL-EDUCADO com ele sobre o LIXO GONORRÉICO que escreve, e logo ANDAR SOBRE SUA CARA e GOLPEAR SUAS PARTES ÍNTIMAS” [id.]

JRR Tolkien é repulsivo”

Outro que tem a língua podre – me disseram que ele mal freqüenta livrarias, lhe dá enjôo… – é o argentino César Aira:

“No último Congresso da Língua vi Saramago, Sábato… alguns chegam a um ponto que nos dão vergonha alheia”

“O melhor Cortázar é um Borges ruim”

Os beats apanham o seu tanto:

Walt Whitman recitado por um caminhoneiro, o budismo ao alcance dos leitores de Reader’s Digest e um incalculável palavreado de bêbado pseudofilosófico” [Juan Luis Panero sobre Jack Kerouac]

“O que faz não é escrever, é bater à máquina” [a clássica de Truman Capote sobre Kerouac]

Hemingway é alvo fácil:

“Que outra cultura poderia ter produzido alguém como Hemingway sem perceber a piada?” [Vidal]

“Não é humano” [F. Scott Fitzgerald]

“Nunca usou uma só palavra que enviasse o leitor ao dicionário” [William Faulkner]

“Tenho muito mais a dizer que Hemingway, e Deus sabe que o digo melhor que Faulkner” [Carson MacCullers]

“Depois de ler o admirável perfil de Hemingway publicado na New Yorker, me dei conta de que sou bonito demais para ser um gênio, abstêmio demais para ser um campeão e idiota demais com as armas para poder viver a boa vida” [Raymond Chandler]

“Não gosto dos homens que tomam o caminho mais rápido” [Faulkner, ao saber que Hemingway se matou]

Sangue!

“Cada vez que leio Orgulho e preconceito me dá ganas de desenterrá-la e golpear seu crânio com sua própria tíbia” [Mark Twain sobre Jane Austen]

Pra finalizar, uma das grandes frases de um escritor que nem sempre as concatenava com igual felicidade:

“Só porque seu cu está sangrando não quer dizer que você seja o cachorro vencedor” [Norman Mailer ironizando um ataque da crítica contra Gore Vidal, que havia respondido com um “O cachorro vencedor é aquele em quem todo mundo quer morder o traseiro”]

Ah: na biografia, diz-se que o antologista Angelo é entomólogo, clarinetista e crítico literário; “sua feroz defesa da privacidade o levou, em várias ocasiões, a disparar com balas de verdade contra jornalistas que queriam entrevistá-lo. Tampouco lhe agradam os escritores”. Faz sentido.

Autor: rbressane

Writer, journalist, editor

9 pensamentos

  1. Hahaha! “Não é humano” e “Cada vez que leio ‘Orgulho e preconceito’ me dá ganas de desenterrá-la e golpear seu crânio com sua própria tíbia” são meus preferidos!

  2. Bressane, acho que o coreano é o único que faz esse papel com conhecimento de causa. E olha que nos últimos tempos não tem como discordar do Kim.
    Abraço!

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