Senta o dedo!

É, eu tenho que admitir: eu tou com o pavio curto.


Qualquer camelô sabe: o mais importante filme brasileiro em 2007 é Tropa de Elite, de José Padilha [roteiro de Padilha, Bráulio Mantovani, roteirista de Cidade de Deus, e Rodrigo Pimentel, ex-capitão do Bope]. Engraçado que o filme nacional mais pirateado da história – antes mesmo de sua estréia – trate justamente de questões como lei, corrupção, crime. O diretor Padilha ficou revoltado com as cópias ilegais de sua produção. Besteira se incomodar com isso: a pirataria só vai fazer de Tropa de Elite um blockbuster – óbvio que, depois que eu vi uma cópia vagabunda na minha TV de 18 polegadas, vou querer assisti-lo no cinema, tendo acesso direto à adrenalina estimulada pelos cortes afiados de Daniel Rezende [outro cara que também trabalhou em Cidade de Deus].

A certa altura, o capitão Nascimento [Wagner Moura, um monstro] pergunta: “Quantas crianças vão ter de morrer pra um playboy poder fumar seu baseado?“. Responderia com outra pergunta: quantas crianças vão ter de ficar sem comer pra um playboy poder assistir a seu filminho pago com lei de incentivo? O filme trata de nego fudido, que não tem 16 reais nem panos bacanas pra se acomodar nas poltronas do espaço Unibancool e depois pagar de intelectual segurando seu café com o mindinho pra cima. Mas nego fudido tem 5 reais pra comprar uma cópia e distribuir geral entre os amigos. Essa é a nova lei.

Tropa de Elite é um marco ao demonstrar, tanto no conteúdo como em sua distribuição, que o que manda é a demanda. Policiais honestos são corrompidos, filhos são perdidos, vidas são destruídas por conta da estúpida criminalização das drogas. Legalize-se a venda pra acabar com isso. Sim, estou falando em descriminar a compra e a venda. Não adianta descriminar pro usuário filhinho-de-papai e continuar mandando o traficante pro xis. É a mesma coisa que liberar o pão mas prender o padeiro.

Uma noite, no morro de Santo Amaro, Rio, de frente pro Bope, o gerente do branco e do preto [ou seja, o traficante que vende pó e maconha] com 23 anos e mais ou menos 26 mortes nas costas me disse, enquanto enrolava um enorme baseado: “Lógico que não vão querer acabar com a proibição. Quem é que ganha com isso? A tua consciência de playboy? Deixa como está, que todo mundo ganha. Agora, se eu pegar filho meu com o nariz branco, quebro ele inteiro“.

A proibição, que nasce da hipocrisia em admitir a eterna necessidade humana em alterar seu estado psíquico, gera mais hipocrisia. E a proibição é – desculpe o trocadilho – inventada por uma elite. Uma elite que tem acesso às drogas, mas afirma que “o Brasil não está preparado para a legalização”. Ouvi muito isso de advogado, jornalista, médico, empresário, artista, político e executivo de nariz branco e olho vermelho. Como diz o Nascimento, dá vontade de sentar o dedo nessa cambada hipócrita.

Teria muito mais a falar desse filmaço, mas paro por aqui. Afinal, 12 de outubro ele está nas telas… se bem que, até lá, você sabe onde achar a parada. Quem quer a parada sempre sabe onde achar.

Autor: rbressane

Writer, journalist, editor

20 pensamentos

  1. Bressane … peguei atrasado o bonde dos blogs mas tô gostando… o seu é classe !!!foi dos poucos a falar do agripino de quem eu falo hj…
    quanto ao tropa de elite vi vários trechos no youtube indicados pelo meu filho e acho que tem tudo pra ser o bom do ano mesmo… apareça, abraço
    ricardo soares

  2. Bressane, é isso. Pra que liberar, pros neguinhos ficarem legalmente ricos? Pros caras terem que achar outra fonte maneira pra lavar e enxugar dinheiro? e se acabasse o tráfico, o que o BOPE ia fazer da vida? O tráfico é uma beleza, dá leite e pão pra freguesa.
    Abração. Tb vi a copia pirata, alias comprei duas.

  3. Oh-oh. Vou destoar da sua ingenuidade. Vc acha mesmo que crime acaba com legalização do que vende o crime? OK. Só falta vc começar a comparar com a Holanda etc etc (ainda bem que não começou a enveredar por esse caminho… lá não tem nem morro, quem dirá na porta de casa…). Legalizou as leves e a bandidagem vende “escondido” nos coffee shop drogas pesadas. E boa polícia na rua pra prender imigrante da Africa e da Europa do Leste que vende qq merda agarrando seu braço à luz do dia e a polícia fica olhando, meio impotente, pq os caras falam em Uga-Uga, língua ainda não decodificada. Vem cá, pq vc não sugere tb a legalização do turismo sexual e da exploração de menores no ramo? Sim, pq o Brasil não consegu lidar nem com esses turistas, imagina com os que aumentariam consistentemente por drogas. Já vi muita gente de férias na Holanda pensndo que tudo pode e terminar na delegacia. Morei lá. País careta, por isso “funciona”. Começando por não atravessar no verde. Igualzinho o rio, o Brasil. Ah, tem uma Bolívia gigante do lado lá tb, sabe? Seu texto se contradiz em si mesmo.
    Vem cá, pq vc não altera seu estado psíquico pensando?
    Recomendo, só uma pitada: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u338292.shtml

  4. Haha! Gostei, Ludmilla. Afinal um contra-argumento inteligente. Pensar é o melhor alterador psíquico, com certeza. Tenho certeza de que afirmar ‘a legalização das drogas acaba o crime’ é mesmo ingenuidade. No entanto, prefiro ser ingênuo a hipócrita e covarde. É evidente que a legalização vai trazer muitos outros problemas – alguns relacionados com outros tipos de violência, outros relacionados a controle e poder. Acontece que vejo a legalização total de modo filosófico. O homem deve ser responsável tanto pelo seu céu quanto pelo seu inferno. Não acredito que alguém – o Estado, os médicos, a Igreja etc – possa vir apontar o dedo na minha cara e dizer o que eu posso ou não fazer. Quem decide sou eu, quem goza sou eu, quem se estrepa sou eu. A culpa é minha, para o bem e para o mal. E qualquer proibição retira esse simples pressuposto. Essa discussão não tem fim, Ludmilla, e paro por aqui… mas te afirmo que fechar a questão com um “Não pode” é muito mais ingênuo do que tentar manter as portas abertas para diferentes ângulos do problema.
    beijo
    RB

  5. Covarde pra vc é o que? Não querer dar diheiro pra traficante como eu, Bressane? Ingenuidade É covardia. Covardia de pensar. Se é tão evidente os outros tantos problemas que vc acha que vai trazer, mas que na verdade já existe, porque não pensa em algo melhor? Eu não uso drogas, exceto Coca-light e infelizmente é legal (e não é brincadeira, trato de me livrar dessa praga com muito suco de caju mas não consigo- pode rir, mas eu sei bem que merda é essa coca disfarçada contra minha saúde e não estou falando de junk food). RB, quanto ao pode e não pode, a droga é um problema de CRIME, saúde pública, vidas alheias e é muito fácil vc falar. Sou branquíssima, minha infância foi excelente e perto de bairros muito pobres, a história da minha família tem um espectro muito amplo para eu aceitar esse tipo de filosofia contra a realidade. A filosofia seria linda, se vidas humanas inocentes nas favelas não estivessem sendo perdidas todo dia por causa do “posso/não posso”. Se funcionau, chapéu. Mas eu pensei demais até chegar à conclusão de que sinceramente, não creio na descriminalização. Aliás, nêgo “inteligente” vai na farmácia mesmo, como disse nosso amigo lá em cima.

    Tinha um comentário meu que, por paus no safari, não foi enviado. Vou enviá-lo agora. Mas até “obrigada” por responder.

  6. Tipo: vc “pode” tomar drogas com ou sem lei, mas quando tem um morro atrás da tua casa com gente armada até os dentes, vc não pode ser tnao ingênuo. Não esteas na Suíça, se não percebeste. (Lá, morei com um amigo cujo entrepiso do prédio tinha um pé de maconha de uns 3 metros de altura, decorativo: ninguém fumava aquela merda, e ninguém enchia o saco também. Agora, morro lá é pra quem tem muita grana pra desfrutar do “direito à vista” como eles chamam – e como deveria ser no Rio, pobre e lindo Rio. Ah, o comentário. Segue.

  7. Mas que droga, meu comment sobre a lei de incentivo não vai. Cansei 🙂 Outro dia eu volto, tenho uns deadlines aqui 🙂 jeje!

  8. Ludimilla,

    Eu estava ironizando. Se as drogas fazem tanto mal pra saúde e não podem ser legalizadas, esvaziem as estantes das farmácias de tudo o que possa ser viciante e usados pra fins recreativos. Muita coisa vai sair e ficar ilegal. Aí teremos pessoas procurando, a oferta vai fazer tudo ficar caríssimo e os traficantes vão fazer aquela grana – dinheiro de sobra pra comprar armas…

    Veja bem: drogas são o monumental problema de segurança que são por causa da criminalização. É isso que sustenta a indústria do tráfico internacional – e também dá uma grana ótima para os fabricantes de armas!

    Legalização não é um processo simples e culpar o usuário não vai fazer com que ele deixe de comprar e consumir. Subir em morro pra trocar tiro com a consequência de 10 anos de negligência estatal só serve pra governador fazer discurso bonito em véspera de eleição.

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